A discussão sobre a diferença entre ato de mercado e ato cooperativo tem ganhado destaque no contexto da recuperação judicial. O Dr. Rodrigo Gonçalves Pimentel, sócio do escritório Pimentel & Mochi Advogados Associados, comenta que compreender essa distinção é fundamental para empresários e produtores rurais que enfrentam dificuldades financeiras e precisam avaliar a viabilidade de recorrer a esse mecanismo jurídico.
Em cenários de crise, restringir o alcance da recuperação apenas a certas obrigações pode comprometer a função social da empresa e do produtor. Por isso, a interpretação mais coerente com o espírito da Lei 11.101/2005, especialmente após as alterações da Lei 14.112/2020, é a de que o ato cooperativo também representa, em sua essência, um verdadeiro ato de mercado, devendo ser tratado como tal na recuperação judicial.
Por que o ato cooperado também é ato de mercado?
Na prática, tanto os chamados atos de mercado quanto os atos cooperados geram obrigações de natureza econômica. De acordo com o núcleo de Recuperação Judicial do escritório Pimentel & Mochi, ao repassar insumos, comercializar conjuntamente a produção ou viabilizar crédito, a cooperativa realiza operações que têm efeito direto no mercado e nas relações de consumo.
Portanto, ainda que a legislação específica das cooperativas (Lei 5.764/71) conceitue esses atos como “não mercantis” em razão da sua forma associativa, não há como negar que produzem reflexos patrimoniais e concorrenciais típicos do mercado. Afinal, impactam preços, circulação de bens e a própria dinâmica econômica do setor produtivo.
Assim, sustenta o Dr. Lucas Gomes Mochi, sócio do escritório, tratar o ato cooperativo como ato de mercado é reconhecer sua verdadeira natureza econômica e proteger os cooperados e produtores em momentos de crise, ampliando o alcance da recuperação judicial como instrumento de preservação da atividade.
Os impactos práticos para empresários e produtores
Sob essa ótica, tanto empresários quanto produtores rurais vinculados a cooperativas devem ter a possibilidade de reorganizar seus passivos dentro da recuperação judicial. Isso porque as dívidas oriundas de atos cooperativos não deixam de ser compromissos financeiros que refletem diretamente na saúde econômica do devedor.

Negar essa realidade significaria enfraquecer o sistema protetivo criado pela Lei de Recuperação, que busca preservar a atividade produtiva e os empregos. Para pequenos e médios produtores, especialmente, a distinção artificial entre ato cooperativo e ato de mercado poderia inviabilizar a superação da crise, contrariando a função social do instituto.
Cuidados estratégicos para ampliar a proteção
Ao considerar o ingresso em uma recuperação judicial, empresários e produtores devem adotar cuidados que reforcem esse entendimento ampliativo. Entre eles, destacam-se:
- Mapeamento das obrigações: demonstrar que, mesmo quando formalmente classificadas como atos cooperativos, as dívidas possuem conteúdo econômico e refletem relações típicas de mercado.
- Construção de fluxo de caixa realista: evidenciar que a superação da crise depende da inclusão de todas as obrigações, inclusive aquelas ligadas à cooperativa.
- Negociação preventiva com credores: envolver cooperativas no diálogo prévio fortalece a tese de que suas operações se inserem no mesmo ambiente mercadológico.
- Planejamento jurídico sólido: estruturar a defesa com base na função social da empresa e na preservação da atividade econômica, princípios que devem prevalecer sobre formalismos interpretativos.
A importância da clareza jurídica no momento decisivo
Em última análise, reduzir os atos cooperados a meras relações internas da cooperativa, afastando-os da recuperação judicial, representa ignorar sua natureza econômica. Como destaca o Dr. Rodrigo Gonçalves Pimentel, a recuperação judicial deve cumprir seu papel de preservar empresas, produtores rurais e empregos.
Reconhecer o ato cooperativo como ato de mercado é, portanto, medida de justiça econômica e de coerência jurídica, fortalecendo a efetividade do instituto da recuperação judicial no Brasil.
Autor: Hiramaki Thicame